"Sem título" | "Untitled"
Uma Certa Falta de Coerência
Porto, 2010

Registo fotográfico: Pedro Tropa
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Sem título
Uma Certa Falta de Coerência

Cortar o espaço como uma faca. Não como um acto de violência directa, mas com a violência que todas as coisas perspicazes e necessárias possuem.
Poderíamos começar por dizer que o trabalho de António Bolota intervém de maneira incisiva, mesmo que muitas vezes discreta, onde são expostos. E que todos os seus trabalhos são feitos especificamente como resposta a um determinado espaço, mas podíamos cair numa ideia errada, a partir do momento em que os materiais cuidadosamente escolhidos se tornam uma peça deixa de haver distinção entre o espaço onde a obra existe e a obra em si, é tudo o mesmo lugar. Não há absolutamente distinção entre o que é interior ou exterior à obra, mesmo que a escultura ou instalação ou vídeo ou acção dure um minuto, durante esse minuto ela é o lugar.

Para a exposição no uma Certa Falta de Coerência António Bolota coloca como que numa grelha ortogonal, uma serie de pilares que parecem sustentar o tecto, este pilares, vigas maciças de madeira (claramente uma secção de uma árvore) que foram queimadas. parecem ruínas, pedaços de carvão ou o subterrâneo de uma cidade em queda.
Esta disposição, não inocentemente, lembra as fundações de uma cidade, uma cidade que, com mais ou menos poder acima do solo, tem as fundações podres.
Não há aqui forma de fugir à analogia como a cidade onde a peça é exposta, fundações em ruínas por de trás das fachadas de granito. Como Veneza, mais cidades afundam.

Também, o seu ritmo subterrâneo, como um criptopórtico, impõe-se no planta irregular e labiríntica do Uma Certa Falta de Coerência. Como uma sobreposição de grelhas ou pilares que atravessam uma paisagem.
As colunas ligam o chão ao tecto, não lhes deixando espaço para serem objectos ou obras de arte, agora são o edifício. Mesmo sem exercer uma força estruturante na efectiva sustentação do edifício, este pilares na rua redundância parecem suportar um tecto mais pesado, um peso inexistente mas que se sente como pressão atmosférica ou na pressão de profundidade, a apertar os pulmões.
Esculturas e edifícios vivem na mesma tensão, numa duração indeterminada e na imanência da ruína. 


André Romão

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